sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Homofóbicos.


Olá Leitor!



Um acontecimento recente, bem próximo de mim, e muito, mas muito desagradável, me motivou voltar à escrita, com um tema polêmico e ao mesmo tempo de extrema relevância: HOMOFOBIA.

Não, leitor, não é tema batido e nem repetitivo. Ainda presenciamos cenas de barbárie como assassinatos brutais, violência gratuita e agressões inexplicáveis, tanto no contexto físico quanto no psicológico. Crueldades que não se registram nem mesmo entre os mais selvagens e perigosos animais da natureza. Seria um tema batido se de fato as pessoas, de modo geral, estivessem já educadas e firmes na iniciativa de combater qualquer forma de preconceito e respeitar o ser humano em sua totalidade.  Infelizmente não é isso o que acontece.

Vamos lá!

Apesar de o termo HOMOFOBIA significar literalmente “medo ou aversão do que é igual”, ele foi aplicado no senso comum como “medo ou aversão ao indivíduo, homem ou mulher, com orientação homoafetiva ou homoerótica”.  Se pensarmos bem, o termo adequado para isso seria HETEROFOBIA, pois teria como significado o “medo ou aversão do que é diferente” e serviria para nomear a tal intolerância com aquele que é diferente nas crenças, práticas, vivências, desejo, etc.

Diante deste esdrúxulo (mas verdadeiro) comparativo, de imediato, podemos perceber que se trata de preconceito em relação ao que o outro faz, a forma como vive, seus valores, seus desejos, seu convívio, sua educação, sua cultura.

Estranhamente, o ponto que definitivamente me leva à preocupação em relação ao tema é que, geralmente, o indivíduo homofóbico exerce sua ação restritiva, violenta, agressiva, sem que tenha sido efetivamente provocado para isso. O que quero dizer, é que são poucos os casos em que um homoerótico ou homoafetivo deliberadamente exerce uma provocação dirigida ao homofóbico. E como você, leitor, já deve ter percebido, é sobre este último elemento que vou explanar.

Saindo um pouco do discurso raso de que todo homofóbico tem a sua sexualidade mal resolvida, embora este possa, sim, ser um dos motivos para que ele exerça a perseguição, desejo, antes, levantar outros pontos para reflexão.  


O preconceito sobre qualquer coisa significa, de imediato, desconhecimento de um conceito, má elaboração de um conceito, pré-concepção sem base acerca de um conceito ou ainda distorção de um conceito. Explico: para lidar com os temas cujos conceitos desconhecemos, de modo geral, utilizamos um mecanismo de elaboração e aplicação de códigos de regras captados do meio onde estamos inseridos (família, religião, escola, sociedade, etc.). Às vezes, as informações captadas são suficientes para a compreensão de um determinado conceito ou fenômeno a ele ligado. Às vezes não. Por outras vezes, mesmo desconhecendo o conceito e usando esse mecanismo que forma o “pré” conceito, acontece uma sintonia com o dado fenômeno atrelado ao conceito e dessa forma, não gera desconforto nem para quem não conhece de fato o conceito e nem para quem está diretamente ligado ao fenômeno. Por outro lado, quando ocorre uma distonia, instala-se um desconforto, uma frustração e um desprazer. Estes aspectos, por sua vez, virão a eliciar as atitudes de rejeição, negação e eliminação do fenômeno, tudo e todos a ele relacionado. A frase que resume este caminho é: “eu rejeito, nego e elimino aquilo que ignoro ou que não compreendo”. 
 
Vimos a base, o alicerce.  Avançando um pouco mais, vamos nos deparar com o medo e a aversão. O medo é um mecanismo irracional, usado para prevenir ou evitar coisas ou situações que ponham em risco nossa integridade física e psicológica. É irracional pelo fato de colocar o corpo em alerta para ações rápidas e defensivas, às vezes reflexas.  A frase de quem teme alguma coisa é: “eu me defendo daquilo que me dá medo”. 

A aversão refere-se às sensações (geralmente orgânicas que podem também estar acompanhadas de respostas emocionais) de extrema aflição e desagrado, tais como a dor, a náusea, sensações de tontura, falta de ar, choro convulsivo e eliciar reações, por exemplo, coléricas. A frase que pode exemplificar uma pessoa que tem aversão é: “eu sofro muito, passo mal com aquilo que me aflige”.

O termo fobia está associado ao medo e à aversão. É uma manifestação excessiva, absurda de medo e/ou aversão e só pode ser controlada através da evitação permanente do objeto ou situação específica, causadora dessas sensações. Cabe dizer que a angústia sentida pelo fóbico não é proporcional ao perigo, porém o sentimento fica incontrolável.  Os cientistas do comportamento afirmam que ela é aprendida, tanto quanto a resposta de evitação ou eliminação do estímulo.  Uma frase representativa de um fóbico pode ser: “Tire isso daqui! Não posso suportar!”.

Por fim, é necessário colocar em cena as questões inconscientes que vão desde os traumas ou experiências vividas como traumáticas no passado, que são jogadas para o esquecimento e terminam deslocadas para respostas emocionais de aversão, medo e fobia a objetos, pessoas ou situações que as evoquem. É aquilo que mencionei no começo como tornado senso comum acerca da homofobia ou ainda da violência sexual, onde as pessoas insistem em generalizar que todo homofóbico é um gay enrustido, que foi abusado quando criança ou que sofreu um trauma na infância; assim como generalizam que todo abusador um dia foi abusado. É possível, mas não é regra. A frase que exemplifica este indivíduo pode ser: “Odeio isso. Não preciso de motivo. Simplesmente odeio isso”.

De certo modo, quando ficamos sabendo de uma barbaridade cometida contra um(a) homossexual, bissexual, transgenero ou travesti, o homofóbico envolvido está mais próximo deste último tipo, já que desenvolve um quadro psicopatológico mais intenso, beirando a psicopatia, ou seja, perde o critério e julgamento dos próprios atos em relação ao outro. Por esse motivo esse tipo de homofóbico ficou mais conhecido.

Vale dizer, no entanto, que os outros tipos citados também podem exercer (e o fazem) atos homofóbicos bastante agressivos, seja física ou psicologicamente. Nesse caso, estamos falando inclusive do bullying, cuja ação pode mesmo induzir a vítima até ao suicídio.

A descrição dos tipos acima, me faz pensar muitas coisas, leitor. Entre elas, como fica o discurso homofóbico padrão: “Eu rejeito, nego e elimino o gay, pois não o compreendo. Como não o compreendo, tenho medo e preciso me defender. Isso me aflige e provoca sofrimento, pois passo muito mal. Portanto, quero que tire esse gay daqui, da minha vida ou do meu convívio! Não posso suportar! Odeio gays e não preciso de motivo. Simplesmente odeio gays”.  Não preciso mencionar o quanto é lamentável.


Pensei também numa cena que vi, certa vez, num documentário sobre a faixa de Gaza. No documentário aparecia um homem jovem ensinando e forçando seu filho de 3 ou 4 anos a ofender e tacar pedras em quem estivesse do outro lado da cerca. Igualmente, do outro lado, outro homem, com um filho entre 5 e 6 anos, ensinava e forçava a mesma coisa.  Duas crianças, em lados opostos, sendo ensinadas e violentadas (sim, violentadas! Crianças não nascem agressivas. Isso é uma violência.) para se odiarem mutuamente, por motivos (conceitos) que naquele momento, em função de suas idades e fases de desenvolvimento, jamais conseguiriam compreender e elaborar. Este é um excelente exemplo de como se instala o preconceito e mesmo a fobia.  Dependendo das chances e possibilidades dessas crianças, talvez pudessem resignificar esse aprendizado, a partir da apreensão do verdadeiro conceito envolvido nesse fenômeno político social e escolher outro caminho, outra atitude que não a agressão e a destruição do outro. Num paralelo, o que quero dizer aqui é que, o homofóbico, seja por trauma inconsciente, seja por ignorância (a maioria), seja por aprendizado, tem a possibilidade de resignificar e abandonar a atitude destrutiva.

Portanto, pode-se estabelecer que o homofóbico ou (1) é um ignorante que se deixa levar por um preconceito (ignorante, aqui neste texto, é aquele que ignora algo, no caso, o conceito); ou (2) é um medroso que deposita na figura do homossexual um perigo fantasioso para sua integridade física e não quer superar esse medo; ou (3) aprendeu algo errado e desenvolveu uma fobia inexplicável, a qual não tem disponibilidade para corrigir, ou (4) tem uma aversão que pode estar relacionada com experiências inconscientes que carecem de tratamento.  Em todos os casos acima descritos, o homofóbico, quando questionado sobre o que o motiva para a agressão, não consegue uma explicação coerente e fundamentada.  Não há conceito.

Quando pensamos nestes tipos, há ainda que lembrar que aqueles que exercem o mesmo papel dos pais, naquela cena do documentário sobre a faixa de gaza, são tão ou mais perigosos e doentes que aqueles a quem “educam” para o preconceito e para a agressão.  Atualmente, em nosso país enfrenta-se um momento delicado, posto que muitos líderes de certos grupos religiosos atestam que a homossexualidade é algo para ser erradicado da face do planeta. São (des)educadores que pregam um sem número de distorções e ainda afirmam que isso é em nome de Deus. Não bastaram as guerras santas para demonstrar que quando se trata do Criador, não há como encaixar agressão, eliminação, destruição? Nada disso pode “criar”!

Além disso, surpreendentemente, a pessoa que deveria cuidar e assegurar os direitos humanos a todos em nosso país, não passa de um poço de preconceitos no que se refere à diversidade racial, econômica e sexual.

Mas, voltando ao tema original (sem ter saído dele), o homofóbico que se deixa crer nos preconceitos ensinados por outros homofóbicos ou aqueles que “entram no embalo” do bullying com um colega de escola, de trabalho, de grupo, um membro da família, geralmente acreditam que estão cumprindo uma missão, fazendo um bem para a humanidade. Em suas fantasias são verdadeiros heróis que, porém, não fazem o bem pelo simples fatos de fazê-lo. Esperam um tipo de pagamento. Uma recompensa, um reconhecimento, um lugar especial na preferência do líder. Nutrem a expectativa de, a partir de seus atos “(in)sanitários”*, serem premiados e elevados diante dos demais.  Sentem-se imbuídos de um poder maior que lhes permite acusar, julgar e penalizar o outro que apenas quer ter o direito de viver o seu amor, seu desejo e seu prazer, assim como qualquer pessoa. Aqui, o crime que é imputado é o ser diferente daquilo que, sabe-se lá quem, definiu como norma a ser seguida, regra a ser mantida.  (*trocadilho do autor)

Também esses tipos de homofóbicos são doentes. Carentes de reconhecimento, de afeto e de amor, tentam realizar algo (ab)usando da integridade do outro. Perdem a noção de humanidade, de humildade e de fraternidade.

Pois é, leitor, como disse lá no começo, nesta semana estive às voltas com esse tema, de forma muito próxima. Me chocou, surpreendeu, desgastou, mas resultou nestas reflexões que, de verdade, me auxiliam muito no exercício de minha profissão onde busco orientar as pessoas no sentido de serem melhores e assim , produzirmos um mundo melhor.  Às vezes esbarramos com ignorantes, preconceituosos, presunçosos que se arvoram de um falso heroísmo e do falso direito de “eliminar” o que é diferente.

Sim leitor, são essas as manifestações da homofobia. Ferramentas ardilosas que os vários tipos de homofóbicos usam às vezes de maneira sutil e com as quais, seja de fato ou simbolicamente, ceifam relações, destroem afetos, trituram grupos e amizades, acabam com famílias. Lamentavelmente não percebem que, na verdade, estão sempre destroçando a si próprios e comprometendo-se gravemente com a humanidade que fica ferida cada vez que qualquer um dos seus é também ferido. Esperemos que parte deles desperte e busque a compreensão, o conhecimento para a superação do preconceito e especialmente a ajuda para resignificar suas dores.