Olá Leitor!
Um acontecimento recente, bem próximo de mim, e
muito, mas muito desagradável, me motivou voltar à escrita, com um tema
polêmico e ao mesmo tempo de extrema relevância: HOMOFOBIA.
Não, leitor, não é tema batido e nem repetitivo. Ainda
presenciamos cenas de barbárie como assassinatos brutais, violência gratuita e agressões
inexplicáveis, tanto no contexto físico quanto no psicológico. Crueldades que não
se registram nem mesmo entre os mais selvagens e perigosos animais da natureza.
Seria um tema batido se de fato as pessoas, de modo geral, estivessem já
educadas e firmes na iniciativa de combater qualquer forma de preconceito e
respeitar o ser humano em sua totalidade.
Infelizmente não é isso o que acontece.
Vamos lá!
Apesar de o termo HOMOFOBIA significar literalmente “medo ou aversão do que é igual”,
ele foi aplicado no senso comum como “medo ou aversão ao indivíduo, homem ou
mulher, com orientação homoafetiva ou homoerótica”. Se pensarmos bem, o termo adequado para isso
seria HETEROFOBIA, pois teria como
significado o “medo ou aversão do que é diferente” e serviria para nomear a tal
intolerância com aquele que é diferente nas crenças, práticas, vivências,
desejo, etc.
Diante deste esdrúxulo (mas verdadeiro) comparativo,
de imediato, podemos perceber que se trata de preconceito em relação ao que o
outro faz, a forma como vive, seus valores, seus desejos, seu convívio, sua
educação, sua cultura.
Estranhamente, o ponto que definitivamente me leva
à preocupação em relação ao tema é que, geralmente, o indivíduo homofóbico
exerce sua ação restritiva, violenta, agressiva, sem que tenha sido
efetivamente provocado para isso. O que quero dizer, é que são poucos os casos
em que um homoerótico ou homoafetivo deliberadamente exerce uma provocação
dirigida ao homofóbico. E como você, leitor, já deve ter percebido, é sobre este
último elemento que vou explanar.
Saindo um pouco do discurso raso de que todo
homofóbico tem a sua sexualidade mal resolvida, embora este possa, sim, ser um
dos motivos para que ele exerça a perseguição, desejo, antes, levantar outros
pontos para reflexão.
O preconceito sobre qualquer coisa significa, de
imediato, desconhecimento de um conceito, má elaboração de um conceito, pré-concepção
sem base acerca de um conceito ou ainda distorção de um conceito. Explico: para
lidar com os temas cujos conceitos desconhecemos, de modo geral, utilizamos um
mecanismo de elaboração e aplicação de códigos de regras captados do meio onde
estamos inseridos (família, religião, escola, sociedade, etc.). Às vezes, as
informações captadas são suficientes para a compreensão de um determinado
conceito ou fenômeno a ele ligado. Às vezes não. Por outras vezes, mesmo
desconhecendo o conceito e usando esse mecanismo que forma o “pré” conceito,
acontece uma sintonia com o dado fenômeno atrelado ao conceito e dessa forma,
não gera desconforto nem para quem não conhece de fato o conceito e nem para
quem está diretamente ligado ao fenômeno. Por outro lado, quando ocorre uma
distonia, instala-se um desconforto, uma frustração e um desprazer. Estes
aspectos, por sua vez, virão a eliciar as atitudes de rejeição, negação e
eliminação do fenômeno, tudo e todos a ele relacionado. A frase que resume este
caminho é: “eu rejeito, nego e elimino aquilo que ignoro ou que não compreendo”.
Vimos a base, o alicerce. Avançando um pouco mais, vamos nos deparar
com o medo e a aversão. O medo é um mecanismo irracional, usado para prevenir
ou evitar coisas ou situações que ponham em risco nossa integridade física e
psicológica. É irracional pelo fato de colocar o corpo em alerta para ações
rápidas e defensivas, às vezes reflexas.
A frase de quem teme alguma coisa é: “eu me defendo daquilo que me dá
medo”.
A aversão refere-se às sensações (geralmente
orgânicas que podem também estar acompanhadas de respostas emocionais) de extrema
aflição e desagrado, tais como a dor, a náusea, sensações de tontura, falta de
ar, choro convulsivo e eliciar reações, por exemplo, coléricas. A frase que
pode exemplificar uma pessoa que tem aversão é: “eu sofro muito, passo mal com
aquilo que me aflige”.
O termo fobia está associado ao medo e à aversão. É
uma manifestação excessiva, absurda de medo e/ou aversão e só pode ser controlada
através da evitação permanente do objeto ou situação específica, causadora dessas
sensações. Cabe dizer que a angústia sentida pelo fóbico não é proporcional ao
perigo, porém o sentimento fica incontrolável.
Os cientistas do comportamento afirmam que ela é aprendida, tanto quanto
a resposta de evitação ou eliminação do estímulo. Uma frase representativa de um fóbico pode
ser: “Tire
isso daqui! Não posso suportar!”.
Por fim, é necessário colocar em cena as questões
inconscientes que vão desde os traumas ou experiências vividas como traumáticas
no passado, que são jogadas para o esquecimento e terminam deslocadas para
respostas emocionais de aversão, medo e fobia a objetos, pessoas ou situações
que as evoquem. É aquilo que mencionei no começo como tornado senso comum
acerca da homofobia ou ainda da violência sexual, onde as pessoas insistem em
generalizar que todo homofóbico é um gay enrustido, que foi abusado quando
criança ou que sofreu um trauma na infância; assim como generalizam que todo
abusador um dia foi abusado. É possível, mas não é regra. A frase que
exemplifica este indivíduo pode ser: “Odeio isso. Não preciso de motivo.
Simplesmente odeio isso”.
De certo modo, quando ficamos sabendo de uma
barbaridade cometida contra um(a) homossexual, bissexual, transgenero ou
travesti, o homofóbico envolvido está mais próximo deste último tipo, já que
desenvolve um quadro psicopatológico mais intenso, beirando a psicopatia, ou
seja, perde o critério e julgamento dos próprios atos em relação ao outro. Por
esse motivo esse tipo de homofóbico ficou mais conhecido.
Vale dizer, no entanto, que os outros tipos citados
também podem exercer (e o fazem) atos homofóbicos bastante agressivos, seja
física ou psicologicamente. Nesse caso, estamos falando inclusive do bullying,
cuja ação pode mesmo induzir a vítima até ao suicídio.
A descrição dos tipos acima, me faz pensar muitas
coisas, leitor. Entre elas, como fica o discurso homofóbico padrão: “Eu rejeito,
nego e elimino o gay, pois não o compreendo. Como não o compreendo, tenho medo
e preciso me defender. Isso me aflige e provoca sofrimento, pois passo muito mal.
Portanto, quero que tire esse gay daqui, da minha vida ou do meu convívio! Não
posso suportar! Odeio gays e não preciso de motivo. Simplesmente odeio gays”.
Não preciso mencionar o quanto é
lamentável.
Pensei também numa cena que vi, certa vez, num
documentário sobre a faixa de Gaza. No documentário aparecia um homem jovem
ensinando e forçando seu filho de 3 ou 4 anos a ofender e tacar pedras em quem
estivesse do outro lado da cerca. Igualmente, do outro lado, outro homem, com
um filho entre 5 e 6 anos, ensinava e forçava a mesma coisa. Duas crianças, em lados opostos, sendo
ensinadas e violentadas (sim, violentadas! Crianças não nascem agressivas. Isso
é uma violência.) para se odiarem mutuamente, por motivos (conceitos) que
naquele momento, em função de suas idades e fases de desenvolvimento, jamais
conseguiriam compreender e elaborar. Este é um excelente exemplo de como se
instala o preconceito e mesmo a fobia.
Dependendo das chances e possibilidades dessas crianças, talvez pudessem
resignificar esse aprendizado, a partir da apreensão do verdadeiro conceito
envolvido nesse fenômeno político social e escolher outro caminho, outra
atitude que não a agressão e a destruição do outro. Num paralelo, o que quero
dizer aqui é que, o homofóbico, seja por trauma inconsciente, seja por
ignorância (a maioria), seja por aprendizado, tem a possibilidade de resignificar
e abandonar a atitude destrutiva.
Portanto, pode-se estabelecer que o homofóbico ou
(1) é um ignorante que se deixa levar por um preconceito (ignorante, aqui neste
texto, é aquele que ignora algo, no caso, o conceito); ou (2) é um medroso que
deposita na figura do homossexual um perigo fantasioso para sua integridade
física e não quer superar esse medo; ou (3) aprendeu algo errado e desenvolveu
uma fobia inexplicável, a qual não tem disponibilidade para corrigir, ou (4) tem
uma aversão que pode estar relacionada com experiências inconscientes que
carecem de tratamento. Em todos os casos
acima descritos, o homofóbico, quando questionado sobre o que o motiva para a
agressão, não consegue uma explicação coerente e fundamentada. Não há conceito.
Quando pensamos nestes tipos, há ainda que lembrar
que aqueles que exercem o mesmo papel dos pais, naquela cena do documentário sobre
a faixa de gaza, são tão ou mais perigosos e doentes que aqueles a quem
“educam” para o preconceito e para a agressão.
Atualmente, em nosso país enfrenta-se um momento delicado, posto que
muitos líderes de certos grupos religiosos atestam que a homossexualidade é
algo para ser erradicado da face do planeta. São (des)educadores que pregam um
sem número de distorções e ainda afirmam que isso é em nome de Deus. Não
bastaram as guerras santas para demonstrar que quando se trata do Criador, não
há como encaixar agressão, eliminação, destruição? Nada disso pode “criar”!
Além disso, surpreendentemente, a pessoa que
deveria cuidar e assegurar os direitos humanos a todos em nosso país, não passa
de um poço de preconceitos no que se refere à diversidade racial, econômica e
sexual.
Mas, voltando ao tema original (sem ter saído dele),
o homofóbico que se deixa crer nos preconceitos ensinados por outros
homofóbicos ou aqueles que “entram no embalo” do bullying com um colega de
escola, de trabalho, de grupo, um membro da família, geralmente acreditam que
estão cumprindo uma missão, fazendo um bem para a humanidade. Em suas fantasias
são verdadeiros heróis que, porém, não fazem o bem pelo simples fatos de
fazê-lo. Esperam um tipo de pagamento. Uma recompensa, um reconhecimento, um
lugar especial na preferência do líder. Nutrem a expectativa de, a partir de
seus atos “(in)sanitários”*, serem premiados e elevados diante dos demais. Sentem-se imbuídos de um poder maior que lhes
permite acusar, julgar e penalizar o outro que apenas quer ter o direito de
viver o seu amor, seu desejo e seu prazer, assim como qualquer pessoa. Aqui, o
crime que é imputado é o ser diferente daquilo que, sabe-se lá quem, definiu
como norma a ser seguida, regra a ser mantida. (*trocadilho do autor)
Também esses tipos de homofóbicos são doentes.
Carentes de reconhecimento, de afeto e de amor, tentam realizar algo (ab)usando
da integridade do outro. Perdem a noção de humanidade, de humildade e de
fraternidade.
Pois é, leitor, como disse lá no começo, nesta semana
estive às voltas com esse tema, de forma muito próxima. Me chocou, surpreendeu,
desgastou, mas resultou nestas reflexões que, de verdade, me auxiliam muito no
exercício de minha profissão onde busco orientar as pessoas no sentido de serem
melhores e assim , produzirmos um mundo melhor.
Às vezes esbarramos com ignorantes, preconceituosos, presunçosos que se
arvoram de um falso heroísmo e do falso direito de “eliminar” o que é
diferente.
Sim leitor, são essas as manifestações da homofobia.
Ferramentas ardilosas que os vários tipos de homofóbicos usam às vezes de
maneira sutil e com as quais, seja de fato ou simbolicamente, ceifam relações,
destroem afetos, trituram grupos e amizades, acabam com famílias. Lamentavelmente
não percebem que, na verdade, estão sempre destroçando a si próprios e
comprometendo-se gravemente com a humanidade que fica ferida cada vez que
qualquer um dos seus é também ferido. Esperemos que parte deles desperte e
busque a compreensão, o conhecimento para a superação do preconceito e
especialmente a ajuda para resignificar suas dores.
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